quarta-feira, 24 de outubro de 2012

aH-Mar, por Diógenes Maciel

O maior mistério da vida é o amar. Foi por questões de Amor que Helena fugiu com Páris e desencadeou uma guerra de sete anos. Foi por Amor que Ulisses voltou pra casa para reencontrar Penélope. Essas histórias se referem à grande tradição épica clássica: as epopeias homéricas. Foram as epopeias que sugeriram boa parte da matéria mitológica que, depois, foi representada nos grandes festivais trágicos gregos. Foi num desses eventos que Ésquilo apresentou seu Agamêmnon, por volta de quase meio milênio antes da era cristã, como a primeira parte de uma trilogia trágica, chamada de Oresteia, dialogando com os mitos em torno dos Átridas, uma antiga linhagem de reis, envolta em crimes de sangue e desgraças irremediáveis. Helenistas costumam afirmar que a essa tragédia seria construída uma antiodisseia: enquanto Ulisses volta para casa e reencontra sua mulher casta e à sua espera; Agamêmnon, rei de Argos, encontrará sua esposa, Clitemnestra, amaziada com Egisto e tramando contra aquele que volta. São tramas de vingança, que se urdiram no dia da partida para a Guerra de Tróia, quando a rainha teve sua filha mais amada arrancada de seus braços para ser oferecida em holocausto à deusa que impedia a partida das naus gregas – por conta de uma guerra, travada por amores contrariados, Agamêmnon matou sua própria filha. Foi por amar demais que Clitemnestra encontrou seu lado noturno, e foi por isso que ela iniciou a tarefa de eclipsar, com as armas que tinha, o sol de seu rei e marido. Foi pelo amor de Helena – destruidora de naus e de cidades – que se traçaram destinos: como o da jovem sacerdotisa Cassandra, espólio de guerra, que também fará parte do banquete de sangue que se prepara no dia da chegada do rei, ausente depois de lutar e singrar mares. A Erínia lança suas garras, enquanto Thémis luta com Dikê: a vingança dança sobre um tapete púrpura, que leva do cais ao caos. Os direitos de sangue esmorecem diante dos direitos racionais dos homens. O tapete, o cais e o caos, recebendo quem chega, são caminhos para o prazer e para o desconhecido... e só nos lançamos rumo ao que não se conhece por Amar: Ah-Mar! Este projeto é uma grande homenagem a quem ama o teatro, a quem partiu e voltou, e a quem, do cais ao caos, ainda deseja encontrar a ordem. “Ah, mar! O maior mistério da vida é o amar!”

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